Covid está mais letal entre jovens, mostra pesquisa do HCamp

Proporção de mortes entre pacientes com idade entre 35 e 50 anos mais que triplica em fevereiro, na comparação com abril do ano passado

O que os profissionais de saúde que lidam diariamente no combate à Covid-19 têm relatado com base na experiência nos plantões agora tem números que o comprovam: a doença tem mesmo ficado mais grave entre pessoas mais jovens em Goiás. Levantamento inédito do Hospital de Campanha para Enfrentamento ao Coronavírus de Goiânia, a que o POPULAR teve acesso, mostra que as pessoas com idade entre 35 a 50 anos representaram 17,4% das mortes no hospital em fevereiro. Em abril do ano passado, esta população respondia por 5% do total.

O levantamento demonstra que a pandemia tem se agravado principalmente na faixa etária entre 35 e 40 anos de idade. No relatório, o hospital aponta que essa população passou a “fazer parte do grupo de risco de óbito, na instituição”. O levantamento compara o perfil dos pacientes e o desfecho do quadro em caso de morte entre os meses de abril de 2020 e fevereiro deste ano.

As mortes de pacientes com idade entre 35 e 40 anos, que foram estatisticamente irrelevantes no primeiro mês do estudo, agora representam 5,4% do total. Entre os que tinham de 45 a 50 anos, a participação no total de mortes subiu de 5% para 12%. No mesmo período, o número de óbitos entre quem tinha entre 60 e 65 anos reduziu de 12,5% para 9,65% do total. “Também incluímos setembro, para comparação, e a tendência se confirma”, diz o diretor-geral do HCamp Goiânia, Guillermo Sócrates, que é infectologista.

No período comparado, também houve um aumento na proporção de mortes entre os mais jovens. Em abril, 65% das 40 pessoas que faleceram no hospital tinham mais de 65 anos. Em fevereiro, esta faixa etária correspondeu a 52% do total de 93 óbitos.

Ele lembra que o HCamp, por ser unidade de referência, recebe pacientes de várias origens e com estado avançado da doença. Mas, em conversa com outros gestores de hospitais e profissionais de saúde, os relatos são bem semelhantes.

Guillermo Sócrates lembra que, desde o início da pandemia, já era de conhecimento que a Covid-19 pode ser fatal em todas as idades, mas cita algumas explicações para o fato do agravamento atual entre as pessoas mais jovens: a proporção de exposição, por serem mais ativos profissionalmente e socialmente, e a falta de cuidados prévios com a saúde. “As pessoas que têm entre 45 a 50 anos geralmente não sabem que já têm comorbidades, não sabem que são do grupo de maior risco”, afirma.
As novas cepas também entram na conta. De acordo com o diretor-geral do HCamp, já existe comprovação científica de que elas são mais transmissíveis. Guillermo Sócrates lembra que há confirmação da presença em Goiás das cepas do Reino Unido (B.1.1.7) e de Manaus (P.1).

Outro agravante, segundo Gillhermo Sócrates, é que, ao menos no HCamp, os pacientes têm ficado mais tempo internados. Em abril de 2020, na semana epidemiológica com maior pico, a permanência em um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) chegou a 6,9 dias. Em setembro, saltou para 9 dias e, na última semana epidemiológica de fevereiro, a 11,51 dias. Este período acaba se refletindo, também, na taxa de ocupação de leitos críticos. Depois de oscilar em torno de 40% em dezembro, esta taxa subiu para uma média de 95% em fevereiro, mesmo com aumento de 86 para 100 leitos nesse período.

Estado
De acordo com o secretário de Saúde de Goiás, Ismael Alexandrino, o recorte do HCamp se reflete em todo o Estado, ainda que os boletins da Secretaria Estadual de Saúde (SES-GO) não tenham captado esta mudança. Por causa do volume acumulado há um ano, o avanço de casos graves de Covid-19 entre os jovens ainda não mexe com as estatísticas oficiais. “Mas o agravamento da doença entre os mais novos é o padrão do dia a dia”, afirma.

Esta mudança no perfil da infecção pelo coronavírus (Sars-CoV-2) tem sido notada especialmente a partir de janeiro, segundo o secretário, de “forma atípica, sem padrão”. Isso inclui sintomas menos comuns, que não são apenas respiratórios, como dores de cabeça. “Os quadros evoluem rapidamente, sobretudo na infecção pela cepa de Manaus”, alerta Alexandrino.
 
Cuidava da avó, mas morreu aos 30 anos
Aos 30 anos de idade, Mirley Matos é uma dos jovens que morreram em Goiás vítimas da Covid-19. Mãe de duas crianças, morava em Luziânia, no Entorno do Distrito Federal (DF), com uma avó de quem cuidava durante a pandemia. A avó, inclusive, foi a primeira a ser infectada, mas teve apenas sintomas leves. Mirley passou pelos primeiros dias da doença apenas com sintomas leves, mas depois acabou precisando de internação.

Prima de Mirley, a costureira Graziele Rabelo, de 32 anos, conta que foi um susto para a família. “Primeiro ela foi para a unidade de terapia intensiva (UTI). Depois, as informações que recebíamos eram de melhora, até que ela teve uma parada cardiorrespiratória e não resistiu. Jamais imaginamos que isso poderia acontecer. Ela ia fazer 31 anos e a maior preocupação da família era a avó, que passou bem pela doença”, diz Graziele Rabelo. 
A costureira teve Covid-19 em fevereiro e ainda não está completamente recuperada. “Fiquei apenas em casa, com medicação e repouso, mas ainda estou sentindo dor de cabeça e dor nas costas, mesmo depois de tantos dias”, completa. 

Fonte: O Popular
Foto: Wildes Barbosa